A Sociedade pedagógica
José Carlos Libâneo*
Um dos
fenômenos mais significativos dos processos sociais contemporâneos é a
ampliação do conceito de educação e a diversificação das atividades educativas,
levando, por consequência, a uma diversificação da ação pedagógica na
sociedade. Em várias esferas da prática social, mediante as modalidades de
educação informais, não-formais e formais, é ampliada a produção e disseminação
de saberes e modos de ação (conhecimentos, conceitos, habilidades, hábitos,
procedimentos, crenças, atitudes), levando a práticas pedagógicas. Estamos
diante de uma sociedade genuinamente pedagógica, conforme expressão de
BEILLEROT (1985).
Apesar
disso, a Pedagogia como campo de estudos específicos vive, hoje, no Brasil, um
grande paradoxo. Por um lado, está em alta na sociedade.
Nos
meios profissionais, políticos, universitários, sindicais, empresariais, nos meios
de comunicação, nos movimentos da sociedade civil, verificamos uma redescoberta
da Pedagogia.
Observamos
uma movimentação na sociedade mostrando uma ampliação do campo do educativo com
a conseqüente repercussão no campo do pedagógico.
Enquanto
isso, essa mesma Pedagogia está em baixa entre intelectuais e profissionais do
meio educacional, com uma forte tendência em identificá-la apenas com a
docência, quando não para desqualificá-la como campo de saberes específicos. Os próprios pedagogos – falo
especificamente dos que lidam com a educação escolar – parecem estar se
escondendo de sua profissão ao não fazerem frente às investidas contra a Pedagogia
e ao exercício profissional dos pedagogos especialistas, adotando uma atitude
desinteressada frente à especificidade dos estudos pedagógicos e aos próprios
conteúdos e processos que eles representam.
Por razões ainda muito pouco esclarecidas, boa parte dos
sociólogos da educação, psicólogos da educação, filósofos da educação, que têm
seus empregos e suas pesquisas em faculdades de educação, vêm se mobilizando
pela desativação dos estudos específicos da Pedagogia.
Entretanto,
a sociedade atual é eminentemente pedagógica, ao ponto de ser chamada de
sociedade do conhecimento.
Vejamos
alguns exemplos. Está se acentuando o poder pedagógico dos meios de
comunicação: TV, imprensa, escrita, rádio, revistas, quadrinhos. A mídia se
especializa em fazer cabeças, não apenas no campo econômico, político;
especialmente no campo moral, vemos diariamente a veiculação de mensagens
educativas, a disseminação de saberes e modos de agir através de programas,
vinhetas e chamadas sobre educação ambiental, AIDS, drogas, saúde. Há práticas
pedagógicas nos jornais, nas rádios, na produção de material informativo, tais
como livros didáticos e paradidáticos, enciclopédias, guias de turismo, mapas,
vídeos, revistas; na criação e elaboração de jogos, brinquedos; nas empresas,
há atividades de supervisão do trabalho, orientação de estagiários, formação
profissional em serviço.
Há uma
prática pedagógica nas academias de educação física, nos consultórios clínicos.
Na esfera dos serviços públicos estatais, são disseminadas várias práticas
pedagógicas de assistentes sociais, agentes de saúde,agentes de promoção social
nas comunidades etc. São práticas tipicamente pedagógicas. Os programas sociais
de medicina preventiva, informação sanitária, orientação sexual, recreação,
cultivo do corpo, assim como práticas pedagógicas em presídios, hospitais,
projetos culturais são ampliados.
Ano a ano
aumenta o número de congressos, simpósios, seminários. São desenvolvidas, em
todo o lugar, iniciativas de formação continuada nas escolas, nas indústrias.
As empresas reconhecem a necessidade de formação geral como requisito para
enfrentamento da intelectualização do processo produtivo.
O mundo
assiste hoje à 3.a Revolução Industrial, caracterizada pela
internacionalização da economia, por inovações tecnológicas em vários campos,
como a informática, a microeletrônica, a bioenergética.
Essas
transformações tecnológicas e científicas levam à introdução, no processo
produtivo, de novos sistemas de organização do trabalho, mudança no perfil
profissional e novas exigências de qualificação dos trabalhadores, o que acaba
afetando o sistema de ensino.
Não é
casual que parcela do empresariado, surpreendentemente, esteja redescobrindo o
papel da escola na formação geral, para além do interesse pela requalificação
profissional. De fato, com a “intelectualização” do processo produtivo, o
trabalhador não pode mais ser improvisado. São requeridas novas habilidades,
mais capacidade de abstração, de atenção, um comportamento profissional mais
flexível. Para tanto, a necessidade de formação geral se repõe, implicando
reavaliação dos processos de aprendizagem, familiarização com os meios de
comunicação e com a informática, desenvolvimento de competências comunicativas,
de capacidades criativas para análise de situações novas e cambiantes,
capacidade de pensar e agir com horizontes mais amplos. Estamos frente a
exigências de formação de um novo educador.
Verificamos,
assim, uma ação pedagógica múltipla na sociedade, em que o pedagógico perpassa
toda a sociedade, extrapolando o âmbito escolar formal, abrangendo esferas mais
amplas da educação informal e não-formal, criando formas de educação paralela,
desfazendo praticamente todos os nós que separavam escola e sociedade.
* Universidade Católica de Goiás.
* Universidade Católica de Goiás.
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